terça-feira, 17 de agosto de 2010

Caminho da amargura

Quem é capaz de saber minhas amarguras se não eu mesmo?


Ando pelo caminho da amargura e o encontro aflito. Auxilio-o? Desprezo-o? Finjo não tê-lo visto?
Vejo que suas forças se esvaíram. Já não é mais o mesmo. Mas ele luta ainda. Esforça-se. Está cercado de esperança.
Está prostrado, porém, não se entrega. É resistente. Crê na superação. Não vê limites. Ele insiste. Eu insisto.
Eu espero. Olho-o uma vez mais. Espero. Duvido. Acredito. Vejo a tormenta. A tempestade. Ele confia que ainda virá a bonança.

Ele se levanta. E caminha. Um lapso. Torna a se levantar. Retira forças do seu âmago.
Suspira por um instante. Eterno instante. E eu acompanho seu suplício. E me detenho a espreitar seu labor.
A cada passo, um sofrer. Um martírio sua jornada. Ele cai mais uma vez. Coloca as mãos no chão. Reergue-se. Encosta-se em uma parede compassiva. Leva uma mão ao estômago.
A aflição não parece me atingir. É neutra. Impenetrável. Obscura e imparcial. Difícil de se sobrepor.

Ele ampara o rosto com uma das mãos. Parece tentar transpor a barreira da mente. Encontra forças em algo que brota de suas recordações.
Põe-se de pé firmemente. Caminha com lentidão. Confiante. Levanta a cabeça. Vê adiante. Confia. Segue em frente.
Contudo, com a força das lembranças, vêm as lágrimas. Elas escorrem com pureza. Vêm da alma. Machucam-no suavemente. Fazem alusão a dois corações.
Apesar da dor, ele prossegue fielmente. Não se intimida. Acredita. Enfrenta o caminho de amargura. Não se importa com o que sente.

E eu, admirado, sigo-o. Conturbado. Apreensivo. Confiante também. Talvez curioso por saber o que o motiva.
Eu sigo seus passos. Ele deixa para trás um rastro de determinação. Seu coração sangra. Há alguém que o machuca sem tocar nele um único dedo. Isso me deixa perplexo.
Apesar da jornada empreendida, ele se mostra um bom combatente. Um otimista. Sofre, mas luta. Chora, mas sua alma se mantém viva.
Não quero interferir. Mas posso. Assisto de longe a essa procissão ofegante e solitária. Um mundo particular. A sua vida. O caminho de amargura é a minha vida. Ele é o meu reflexo.


Deleir Inácio de Assis

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